Se vestir a camisa da seleção brasileira, o novo ministro do Turismo, Vinicius Lages, arrisca uma final da Copa entre Brasil e Espanha. A aposta é outra, porém, se ele estiver no gabinete do ministério que assumiu há três semanas: “Prefiro uma final com os Estados Unidos. Imagine o impacto disso no turismo?”
Fora do campo, Lages adota um tom mais pragmático ao falar dos benefícios e desafios da realização da Copa do Mundo, seus dilemas com obras de infraestrutura e os desdobramento das esperadas manifestações sociais. Em entrevista ao Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor, Lages prevê uma “grande celebração”, mas reconhece as preocupações do governo com as manifestações. Sobre esses movimentos, diz que se trata de reflexos de “um país que amadureceu”, onde uma nova classe média “reivindica mais direitos”. É preciso aceitar, diz ele, que o futebol “não é mais unanimidade nacional”.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
Valor: O senhor considera que o país está pronto para a Copa?
Vinicius Lages: Nos preparamos para esse momento. Há o reconhecimento de que o Brasil tem uma hospitalidade diferenciada, é um país que sabe receber o turista. Vimos, na Copa das Confederações, que temos condições de afirmar que o sucesso vai se repetir na Copa do Mundo. Isso não significa que todos os aeroportos, por exemplo, estarão concluídos até os jogos. Seria muito precipitado não considerar algumas ocorrências. Mas acredito que não teremos problemas na Copa.
Valor: Há uma reclamação generalizada por obras de infraestrutura que não serão entregues. Qual a avaliação do senhor sobre isso?
Lages: Desde que o Brasil foi escolhido para acolher os jogos, vivemos um processo em que a sociedade passou a ser mais exigente com a oferta de serviços de melhor qualidade. A classe C não é mais complacente com serviços de baixa qualidade. São questões importantes que o país está vivendo. É preciso reconhecer também que o Estado, de seu lado, está investindo e se preparando para atender essas demandas, está se adequando para acelerar os processos. É claro que ainda vamos ter algumas obras por terminar, mas eu considero que a vida continua, no sentido de que essas estruturas, quer aquelas especializadas para os jogos, quer as demais, farão com que o país e o turismo saiam ganhando.
Valor: Há um consenso de que as cidades ganharam estádios, mas não obras de mobilidade.
Lages: Mesmo que isso fosse verdade, e pode ser que em alguns casos as expectativas de fato ficaram acima do que foi possível fazer, é preciso reconhecer que apenas um equipamento esportivo numa cidade é capaz de gerar uma dinâmica enorme dentro de um setor como o de esportes, alterando o padrão de gestão dos times e de todos envolvidos. O Mineirão, em Belo Horizonte, é um exemplo claro do que isso significou no padrão do futebol mineiro. Mesmo que essa afirmação de não haver obras de mobilidade fosse verdade, os estádios permitem a exploração de um vetor econômico importante.
Valor: Mas não é verdade?
Lages: Não é. Temos várias cidades com obras de mobilidade em andamento. Além disso, imagine o impacto do que está ocorrendo, por exemplo, em outros setores como o de engenharia e de serviços especializados. Essas empresas, hoje, estão bem mais preparadas para montar a infraestrutura desse país. Cerca de 15 mil pequenas empresas foram treinadas para aproveitar oportunidades, com serviços que podem gerar até R$ 500 milhões com o torneio. Isso já é um ganho excepcional. A Copa acelerou investimentos, além daqueles que já estavam em curso.
Valor: Como o senhor avalia as manifestações sociais previstas para ocorrer durante a Copa?
Lages: Estamos monitorando isso de forma integrada com outros ministérios. Acredito que a Copa será uma grande festa, mas há um sentimento de expectativa sobre movimentos isolados. É preciso lembrar que vivemos em uma democracia. As manifestações podem acontecer e é muito bom que aconteçam. O Estado, de seu lado, tem mecanismos de inteligência, está preparado para lidar com esses movimentos, para identificar pontos fora da curva e agir em situações preocupantes. Ainda que possamos ter algumas manifestações, a Copa será uma grande celebração. Agora, paralelamente, temos que nos acostumar com o fato de que o futebol não é mais unanimidade nacional. Isso acabou.
Valor: O que o senhor quer dizer com isso?
Lages: Vivemos hoje em uma sociedade mais complexa, de 200 milhões de pessoas, com uma forte e crescente classe média, que reivindica mais direitos. A situação não é mais tão hegemônica. O país amadureceu, mudou. Entre 200 milhões de pessoas, é natural que muitos não queiram futebol, não gostem do Carnaval. Essa sensação de que podemos ter uma unanimidade, em uma sociedade mais bem informada, passou. Temos que lidar com isso. Agora, também é preciso aceitar a maioria, que entende que a Copa é uma oportunidade sem igual, que nos projetará e muito. Temos estádios com uma qualidade que nunca tivemos, uma infraestrutura urbana requalificada. São suficientes? Ocorrem na velocidade que esperamos e que a expectativa social impõe? Não, mas são transformações urbanas importantes e que estão acontecendo.
Valor: A construção de estádios também é alvo de críticas. Cidades como Brasília, Cuiabá e Manaus são acusadas de terem erguido elefantes brancos. O que o senhor pensa sobre isso?
Lages: Uma das belezas dessa Copa é que ela é inclusiva. Foi uma decisão política envolver todas as regiões do país. Mesmo que se diga que há estádios que possam ter uma baixa utilização, eles darão resultado se tiverem uma estratégia bem montada. Vai depender muito disso. Temos que dinamiza-los, são equipamentos multiuso e que terão de ser rentabilizados. Todos têm custo e manutenção elevados. Tudo vai depender dos modelos de negócio e das iniciativas. Em qualquer lugar do mundo é assim.
Valor: O governo é criticado por ter gasto muito dinheiro com a Copa. Gastou?
Lages: Não vejo dessa forma. Estamos falando de um evento que trará um incremento de pelo menos 0,55% sobre um PIB de R$ 5 trilhões. São cerca de R$ 30 bilhões. Um evento desses tem que ser dimensionado em torno de sua relevância. É um impacto bem razoável, principalmente pelos reflexos de longo prazo que ele deixa. Não é nada pequeno. Além disso, o país não deixou de investir em saúde ou educação, em políticas sociais, infraestrutura não especializada nos jogos, frentes para complementar sua estrutura energética. Há um exagero nessa expressão de que se gastou muito com a Copa.
Valor: Recentemente, o TCU apontou atrasos nas instalações dos centros de atendimento ao turista nas cidades-sedes. Eles serão entregues a tempo?
Lages: Eu solicitei um balanço para monitorar a situação. Muito já estão prontos, mas também temos problemas que estão sendo resolvidos. Faremos um acompanhamento nessa reta final. Em alguns casos, onde as obras não ficarem prontas a tempo, teremos algumas estruturas com centros móveis de atendimento ao turista, instalados em pontos estratégicos.
Valor: Que seleção vai para a final da Copa com o Brasil?
Lages: Como ministro, escolho os americanos na final. Eles virão em massa para o Brasil. Imagine numa final, todo mundo celebrando, audiência no máximo, um empate até os 45 minutos do segundo tempo e eles fisgados até o último minuto. Então, sai um golaço do Fred. Seria espetacular.
Fonte: Valor Econômico