Por Pedro Mattos
Exemplos brilhantes sobre o que é transformar uma marca não faltam, o Burger King é um deles – simples com elementos visuais e verbais bem construídos e que transpira os valores da estratégia de marca e cada detalhe dela. Outro case de bastante valor é o da Nude, que inclusive já ganhou prêmios como uma das marcas mais inovadoras em design da América Latina. Trata-se de uma marca de leite de aveia que traz com ela simplicidade, muita irreverência e sofisticação. Não é à toa que a Nude está avaliada em R$135 milhões em apenas quatro anos de vida, seu discurso é entendido de maneira clara em cada ponto de contato.
Esses são alguns exemplos, mas, afinal, o que faz dessas marcas transformadoras? Não é um projeto comum de gestão de marca que dará voz à elas, é preciso muito mais do que isso para se destacar. É trabalhar técnica e estética para agregar valor, partindo da percepção de que branding nada mais é do que o espaço que uma marca ocupa na mente das pessoas. Exercício esse eu diria que um pouco trabalhoso, não é mesmo? Um projeto de design gráfico precisa compreender profundamente o contexto de uma marca como um todo se quiser alcançar ideias inovadoras e fazer a diferença com sua identidade visual.
Principalmente no mundo contemporâneo, à medida que o digital se expande, o branding se torna ainda mais vital e é uma força poderosa que transcende a estética e envolve todos os sentidos. E quando nos referimos a sentidos, são principalmente audição, olfato e tato, além do paladar e da audição. Essas formas de linguagem e o engajamento entre elas se faz ainda mais necessário para uma experiência mais completa. O uso dos sentidos na construção de uma personalidade de marca é uma abordagem inovadora e uma metodologia interessante é pensar em como os cinco sentidos da marca se manifestam, proporcionando um novo ângulo para o brainstorming criativo e a construção da identidade de uma marca.
O tato, por exemplo, embora seja menos explorado no digital, quando combinado com elementos visuais e materiais, enriquece a experiência do usuário e pode ser a base para a linguagem arquitetônica e a escolha de materiais em um ambiente. Já os aromas podem ser aplicados de forma seletiva para criar associações sensoriais específicas.
Narrativas autênticas e estratégias inovadoras, mesmo na era digital, continuam sendo a alma do Branding e desempenham um papel fundamental. Marcas fortes contam com narrativas autênticas. Os designers precisam entender as motivações e valores por trás da marca ou pessoa e seus valores, garantindo que esses elementos sejam refletidos nos produtos ou serviços. Histórias autênticas e relevantes conectam de forma significativa uma marca com seu público-alvo.
Com a ascensão das plataformas digitais, elementos visuais como tipografia e paleta de cores, que sempre foram fundamentais, ganharam uma dimensão ainda maior e se transformaram nas estratégias de branding. A discussão de cores dentro da usabilidade de aplicativos e a escolha da tipografia e da paleta de cores agora desempenha um papel crucial na comunicação das marcas em canais digitais de massa.
A tipografia, especificamente, evoluiu para um formato variável mais rico e dinâmico, adequado para as novas demandas. O “motion design” deixou de ser um elemento opcional e se tornou uma premissa na identidade de marca. A linguagem de interação e as microinterações também se tornaram elementos de identidade, garantindo uma experiência consistente em todos os pontos de contato digitais.
O uso inteligente da tecnologia também é um elemento essencial e faz parte de um bom arsenal de branding. Mas onde ela entra nos projetos contemporâneos de branding? Elas vêm para acelerar ainda mais a produção criativa, agilizar processos, e não para substituir o que é insubstituível: a originalidade humana. A inteligência artificial (IA) e a realidade aumentada (AR) estão moldando as estratégias de branding e são complementos valiosos.
Já utilizamos em nossa agência de branding, a IA para sketches tridimensionais, bases de aplicação de marca e principalmente para entender territórios conceituais. Se em um processo de criação desenvolvemos quatros caminhos, é interessante colocar os conceitos numa inteligência artificial e ver o que volta. Isso pode ser um bom teste de recorrência para ter certeza de qual caminho é mais ou menos diferenciador. Ela não vai criar algo novo, pois a base de conhecimento dela é sobre coisas que já foram criadas. Isso faz com que a criatividade humana ainda seja muito mais original.
A IA pode gerar insights e até mesmo fornecer análises de dados detalhadas para orientar as estratégias de branding. No entanto, o toque humano na criação, na concepção de histórias autênticas e na interpretação de tendências culturais permanece insubstituível.
Por fim e não menos importante, há também a constante preocupação das marcas hoje em dia com a transparência e a responsabilidade corporativa. Neste sentido, o conceito ESG (Ambiental, Social e Governança) ganha destaque. As marcas estão sendo pressionadas a adotarem práticas sustentáveis e éticas, mas essas ações não devem ser a base da identidade e estratégia de marca. Em vez disso, elas devem ser uma prática contínua e integrada nas operações da empresa. As marcas que genuinamente abraçam a responsabilidade corporativa podem se destacar, mas isso deve ser um reflexo autêntico de sua cultura e valores.
Em suma, em meus mais de dez anos de experiência neste mercado, posso ilustrar a importância de um sistema de design sólido, como a um guarda-roupas bem montado e diversificado que permite às pessoas se expressarem em várias situações, de maneira coesa com suas identidades intactas.
*Co-fundador e Head de Design do estúdio especializado em branding Rebu, Pedro Mattos (direita, de vermelho) é artista gráfico, apaixonado por pôsteres e publicações independentes. Sua incansável pesquisa e experimentação artística contribui para sua visão no desenvolvimento de sistemas de identidade. Nos últimos 14 anos, liderou e desenvolveu projetos de branding em algumas das maiores consultorias e agências de branding do Brasil e América Latina, incluindo Mesa, Interbrand, Kantar Consulting, Futurebrand e Almap BBDO, trabalhando para marcas como Youtube, Nike, Itaú, Havaianas e Natura. Em poucos anos no Rebu, criou marcas do zero, como Dengo, Nude, Trela e Cuia, além de rebranding de marcas como Inter, Petlove, Bacio Di Latte e FuturePet.
Entre as afiliações, está a participação na curadoria no Concurso de Cartaz MCB 2023, no júri do Concurso de Cartaz MCB 2022 e como membro do Type Directors Club, além de ser professor na Miami Advertising School. Entre os prêmios recebidos destacam-se Type Directors Club NYC, Latin America Design Awards, IF Design Awards, Best of Behance, Brasil Design Awards, Bienal ADG, Cartaz Museu da Casa Brasileira x 2, Trnava Poster Triennial x 2, Golden Bee Poster Biennial, Greenpeace Design Awards Poster e, por fim, File Media Art.