Por Paulo Gomes, diretor-geral do Instituto dos Auditores Internos do Brasil (IIA Brasil)
De acordo com “The Time Has Come: The KPMG Survey of Sustainability Reporting 2020,” 80% das empresas em todo o mundo agora reportam sobre sustentabilidade. Isso sobe para 96% entre as 250 maiores companhias globais. A América do Norte ostenta a maior taxa de reporte regional com 90%, de acordo com o relatório “2020 S&P Flash Report”, do Governance & Accountability Institute (G&A). A porcentagem de empresas S&P 500, que emitem relatórios de sustentabilidade, cresceu de 20%, em 2011, para 90%, em 2020.
O crescente interesse regulatório em sustentabilidade tem se concentrado em saber se o que está sendo reportado reflete com precisão os esforços de sustentabilidade de uma organização, como esses esforços se relacionam com a criação de valor a longo prazo e como isso influencia os investidores. No entanto, muitas organizações ainda lutam com o que deve ser reportado e como. Soma-se à confusão a falta de um único conjunto de normas sobre as quais as organizações possam construir suas estratégias de reporte de ESG (Environmental, Social and Governance).
A pesquisa de 2020 do G&A revelou que 70% das empresas reportantes contam com frameworks e normas, como os criados pela Global Reporting Initiative (GRI), o Sustainability Accounting Standards Board (SASB) e a Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD), do Financial Stability Board. Esses frameworks refletem muitos dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (ODS), adotados pelos Estados Membros da ONU em 2015, relativos à proteção ambiental até 2030. A complexidade das questões de sustentabilidade se reflete nos 17 objetivos principais e 169 metas subjacentes dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Diante destes números, fica evidente que as conversas e o foco na sustentabilidade, normalmente agrupados em questões ambientais, sociais e de governança, estão evoluindo rapidamente — de grupos de investidores ativistas e reguladores inquisitivos que pressionam por mudanças, a órgãos governamentais e executivos de alto escalão que lutam para entender e abraçar o conceito.
Na vanguarda dessa nova área de risco está a pressão para que as organizações assumam compromissos públicos com a sustentabilidade e forneçam atualizações de rotina precisas e relevantes para as estratégias, metas e métricas relacionadas a ESG. No entanto, o reporte de ESG ainda é imaturo e não há muitas orientações definitivas para as organizações neste espaço. Por exemplo, não há um padrão único do que deva ser reportado.
O que está claro é que uma governança forte sobre ESG — assim como uma governança eficaz em geral — requer alinhamento entre os principais envolvidos, conforme descrito no Modelo das Três Linhas do IIA (Institute of Internal Auditors). Como acontece com qualquer área de risco, a auditoria interna deve estar bem posicionada para apoiar o órgão de governança e a gestão com avaliações, percepções e conselhos objetivos sobre questões de ESG.
As áreas de risco adicionais associadas ao ESG são variadas e podem incluir a dependência de dados de terceiros, danos potenciais à reputação por reporte incorreto e a possibilidade real de que os compromissos explícitos de uma organização em atender às metas de sustentabilidade específicas possam se transformar em uma fraqueza material.
Conforme o reporte de ESG se torna cada vez mais comum, ele deve ser tratado com o mesmo cuidado que o reporte financeiro. As organizações precisam reconhecer que o reporte de ESG deve ser construído em um sistema estrategicamente elaborado de controles internos, e deve refletir com precisão a forma como os esforços de ESG de uma organização se relacionam entre si, com as finanças da organização e com a criação de valor.
A auditoria interna e a jornada e ESG de uma organização
A auditoria interna pode e deve desempenhar um papel significante na jornada de ESG de uma organização. Ela pode agregar valor em um papel consultivo, ajudando a identificar e estabelecer um ambiente funcional de controle de ESG. Ela também pode oferecer o apoio crítico da avaliação, fornecendo uma revisão independente e objetiva da eficácia das avaliações de riscos, respostas e controles de ESG.
Além disso, as funções de auditoria interna que operam em conformidade com as normas globalmente reconhecidas do IIA Brasil estão bem-posicionadas para ajudar as organizações a aplicar frameworks de controle interno credíveis e estabelecidos aos seus esforços de ESG.
Cada vez mais, os líderes empresariais e governamentais estão percebendo a importância do ESG como imperativo empresarial. O bem-estar organizacional está vinculado não apenas a estratégias e métricas financeiras, mas também àquelas que refletem aspectos ambientais, sociais e de governança. Essa abordagem holística é indispensável para a criação de valor de longo prazo. Portanto, o planejamento estratégico, o gerenciamento de riscos e todas as avaliações relacionadas devem incorporar todas as quatro dimensões.
Uma métrica do crescimento do ESG é a mudança de atitudes sobre sua relevância no universo de riscos. O OnRisk 2021, publicado pelo The IIA em setembro de 2020, revelou que a sustentabilidade (ESG) ainda não era vista como uma área de risco significante para conselhos, executivos e auditoria interna. Na verdade, a sustentabilidade foi vista coletivamente como uma das áreas menos relevantes dos 11 riscos examinados no relatório.
Entretanto, isso está mudando. Conforme os movimentos de justiça social e as mudanças climáticas transformam as prioridades organizacionais, investidores e reguladores desafiam as organizações a reportar publicamente suas estratégias, compromissos e ações de ESG. Por meio do reporte de ESG, as empresas que de fato integram as considerações desta temática em sua estratégia de negócios e práticas de gerenciamento de riscos podem comunicar como tais considerações afetam seus negócios e são relevantes para seus stakeholders.
A capacidade das organizações de fazer isso depende do desenvolvimento e da eficácia do controle interno sobre a contabilidade, o reporte e a comunicação de informações. Aplicar o mesmo rigor sistemático para mensurar, validar, gerenciar e reportar informações materiais de sustentabilidade que normalmente são aplicadas ao reporte financeiro deve levar a uma maior confiança corporativa e dos investidores/stakeholders, um maior valor organizacional e uma maior eficácia dos mercados de capitais. E, como acontece com o reporte financeiro, a avaliação independente e objetiva que apenas a auditoria interna pode fornecer deve ser parte integrante dessa resposta.