Eles são fonte de diversão, de aprendizado, de interação. Podem estimular, ainda, reflexões sociais e políticas sobre o nosso tempo. Com o intuito de chamar atenção para as diversas possibilidades dos jogos, a exposição “Playmode”, em cartaz no CCBB Belo Horizonte até 06 de junho, exibe 44 peças assinadas por artistas de diversos países, entre eles sete brasileiros.
Vinda diretamente de Portugal (onde foi exibida no Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia – MAAT) para a capital mineira, “Playmode” subverte a lógica dos jogos. Seja por meio da releitura de clássicos (a amarelinha não tem números, mas casas com nomes de países assolados por guerras) ou conferindo uma dinâmica nada usual aos games eletrônicos (no lugar da velocidade, entra a paciência e a contemplação), as obras tornam-se um campo aberto para novas experimentações, interações e diálogos.
Com produção da N+1 e curadoria dos portugueses Filipe Pais e Patrícia Gouveia, “Playmode” mostra que jogos não são divertimento puro. “Eles podem transformar uma sociedade”, destaca Pais. “Com a digitalização, a lógica dos games está cada vez mais inserida em nossos costumes, sem, muitas vezes, nos darmos conta disso. Jogamos cada vez mais.”, completa o curador.
Pais ressalta que, compreendendo desde muito tempo o poder dos jogos, os artistas integram-no às suas obras com propósitos distintos: evasão à realidade, construção e transformação social, subversão ou crítica dos próprios mecanismos da brincadeira e do jogo. Todos esses pontos, de acordo com ele, estão contemplados na exposição, que é dividida em três grandes eixos. São eles – “Modos de desconstruir, de modificar e de especular”; “Modos de participar e de mudar”; e “Modos de transformar, de sonhar e de trabalhar”. Confira, mais abaixo, os detalhes sobre cada um deles.
Eixo 1: novas regras para jogos clássicos
No primeiro eixo encontram-se as obras que estimulam reflexões sobre os modos de jogar. Valendo-se de jogos bem conhecidos como o xadrez, a amarelinha ou o futebol, as obras fazem uma releitura desses jogos e transformam suas regras. Sugere-se, nessa dinâmica, a revisão de conceitos e o estímulo para promover novas visões do mundo contemporâneo.
É o eixo com maior quantidade de obras na mostra. Lá encontra-se o protótipo do “Xadrez Auto-Criativo” (2019), de Ricardo Barreto e Raquel Fukuda. A instalação interativa propõe uma reformulação do xadrez clássico – suas peças ganham mudanças sutis que o participante vai perceber ao se deparar com o tabuleiro.
Já a obra “Futebol”, de Nelson Leiner, trata com irreverência a religião e a cultura do consumo ao recriar uma partida de futebol com estatuetas religiosas e figuras da cultura pop como o Mickey, a Minnie e Padre Cícero. Em “Mesa de Jogos” (2020), de Laura Lima e Marcius Galan, diferentes jogos de tabuleiro e de cartas são dispostos em cima de uma mesa possibilitando que todos eles possam ser usados ao mesmo tempo – embaralhando as regras e exigindo dos participantes um acordo sobre elas.
Eixo 2: games interativos, mas sem corrida contra o tempo
Composto exclusivamente por jogos eletrônicos interativos, o eixo 2 de “Playmode” propõe uma nova dinâmica sobre a lógicas dos games, onde a velocidade e a ânsia de vencer são colocadas em xeque. Um exemplo é o jogo “The Graveyard”, dos belgas Auriea Harvey e Michaël Samynp. Nele o participante tem a missão de conduzir uma senhora idosa até um banco onde ela possa se sentar. Mas a senhora tem passos lentos e difíceis, por mais que o jogador tente acelerar. Lembrando uma pintura interativa, o jogo remete a uma poesia silenciosa e contemplativa, da mesma forma que nos faz pensar sobre o tempo do outro.
Já na obra “Let’s Play: Ancient Greek Punishment”, do neozelandês Pinpin Barr, o jogador é convidado a vivenciar uma experiência lúdica envolvendo cinco mitos gregos. Em um deles, Sísifo tem que carregar um pedregulho encosta acima, mas, cada vez que atinge o cume do monte, o pedregulho volta a rolar para a sua base. Por mais que se tente, não há lugar para o sucesso, a falha será inevitável.
Eixo 3: likes, pontuações, recompensas: a gamificação na nossa vida
Quem nunca contabilizou likes nas redes sociais ou somou pontos em programas de fidelidade em troca de recompensas? Técnica clássica do universo dos jogos, essa lógica, já naturalizada em nossa sociedade, é tema de reflexão de parte das obras do terceiro eixo da exposição. Em outras obras, brincadeira e jogo são considerados conceitos paradoxais. Por um lado, têm um poder extraordinário para nos subtrair às complicações cotidianas. Por outro, são usados para promover a eficiência e melhorar os resultados no dia a dia ou no trabalho.
Um exemplo é a obra “The Rated Republic of China”, do artista português Filipe Vilas-Boas. Numa sociedade cada vez mais informatizada, as nossas atividades e interações cotidianas deixam rastro — são dados que ficam registrados e podem ser recolhidos, quantificados e avaliados de forma precisa.
Em um sistema de gratificação que parece retirado de um videogame, o governo chinês está desenvolvendo um crédito social que permitirá avaliar a reputação dos cidadãos por meio de um esquema de pontos. Nesta obra, Vilas-Boas modifica sutilmente a bandeira chinesa, fazendo alusão ao modelo de classificação por estrelas e situação radical do método de atribuição de créditos sociais chinês.
Já os vídeos “For a Better World” e “Naar de Speeltuin! (To the Playground!)”, a portuguesa Priscila Fernandes retrata dois tipos de atividades lúdicas. No primeiro vídeo, a artista filma na KidZania de Lisboa. Nessa multinacional de recreação, as crianças brincam em hospitais e caixas de supermercado, entre outros locais de trabalho da vida adulta. Nessa sociedade de crianças, que até tem moeda própria — o KidZo —, compram-se e vendem-se produtos das marcas que patrocinam a KidZania.
Neste jogo de normalização e de fidelização, a criança aprende desde cedo as mecânicas do mundo adulto. Como contraponto dessa visão capitalista do jogo e da brincadeira, Naar de Speeltuin! (To the Playground!) põe em cena um grupo de adultos que brincam num parque infantil e evoca, assim, a importância do regresso à brincadeira autotélica e desinteressada.
Cultura, reflexão e tecnologia
Para o CCBB BH, receber a mostra coletiva “Playmode” representa a oportunidade de levar ao público a inusitada ligação entre arte contemporânea e jogo. “É brincadeira e observação ao mesmo tempo, tendo as novas tecnologias como suporte nessa jornada”, observa Gislane Tanaka, gerente Geral do CCBB BH.
A exposição conta com patrocínio da BB DTVM e o head de produtos, comunicação e marketing da BB DTVM, Isaac Marcovistz, aponta que “O investimento em cultura gera um impacto direto e positivo para a sociedade ao ampliar o acesso, a todas as idades, às exposições de alto valor cultural como Palymode”.
Depois de BH, “Playmode” será exibida no CCBB Rio de Janeiro (19.07 a 12.10), CCBB São Paulo (25.10 a 09.01.23) e CCBB Brasília (01.02.23 a 02.04.23).
Os artistas
“Playmode” reúne obras de artistas e estúdios, produtores e coletivos da Alemanha, Brasil, Croácia, Estados Unidos, França, Grécia, Nova Zelândia, Portugal e Japão. São eles: Aram Bartholl, Bill Viola + Game Innovation Lab, Bobware, Brad Downey, Brent Watanabe, Coletivo Beya Xinã Bena + Guilherme Meneses, David OReilly, Filipe Vilas-Boas, Harum Farocki, Isamu Noguchi, Jaime Lauriano, Joseph DeLappe, Laura Lima + Marcius Galan, Lucas Pope, Mary Flanagan, Mediengruppe Bitnik, Milton Manetas, Molleindustria, Nelson Leirner, Pippin Barr, Priscila Fernandes, Raquel Fukuda + Ricardo Barreto, Samuel Bianchini, Shimabuku, Tale of Tales (Auriea Harvey e Michaël Samyn) e The Pixel Hunt.
Outros textos e imagens da exposição para uso exclusivo da imprensa estão disponíveis em https://agenciagalo.com/playmode/
SERVIÇO
Playmode | Centro Cultural Banco do Brasil Belo Horizonte
Data: 30/03 a 06/06
Funcionamento: de quarta a segunda, das 10h às 22h
Local: Praça da Liberdade, 450 – Funcionários, Belo Horizonte
Entrada gratuita: ingressos devem ser emitidos, preferencialmente, pelo site bb.com.br/cultura com apresentação do QR Code na entrada da exposição. Também é possível retirá-los na Bilheteria do CCBB. O ingresso é válido para o dia agendado.